sábado, 14 de setembro de 2013

Verbos Hebraicos e Ciprestes Obeliscos


Você deve estar neste momento entrando na fase nevrálgica das segundas-feiras. São quase onze da manhã no Ipê Amarelo. 
Voltei hoje da Ulpan pela Floresta de Jerusalém. Pra tirar essas fotos. O cheiro seco dos ciprestes sempre lembra meu irmão. 
Esse aroma está impregnado nas minhas lembranças mais remotas, assim como cheiro de creolina. Você sabe bem do que estou falando...
Mas fazer esse caminho só, me faz voltar no tempo e entendê-lo com uma compreensão que me escapa à razão. 
A Ulpan tem sido uma revolução em minha psique. Começo a assistir minha paixão aumentando pelas letras, pelas palavras, pelos verbos...
E o pior é que também parece que assim como eu eles se apaixonam por mim. Estou começando a sonhar com verbos em hebraico...
São sonhos de amor. Isso movimenta algo em mim que não sei para onde vai nem de onde vem, Léo.
Todo o pânico que sinto quando as professoras me perguntam coisas em que tenho que pensar rapidamente e responder usando presente, infinitivo e formas verbais para os gêneros masculino/ feminino... Meu medo de não saber (e eu sempre sei, é incrível como eu mesmo não dimensiono o aluno aplicado que sou, como muito de mim ainda não acredita nisso) que me paralisa e me confronta com o desconhecido. Tem valido uma terapia. Hoje vi o moleque desengonçado que fui com vergonha das mangas já curtas aquém da minha aceleração de crescimento e com inveja das outras crianças que tinham mãe e roupas sempre novas e impecáveis. Talvez tudo o que aquela criança sofreu um dia seja justamente o que hoje me faz estar aqui escrevendo minha poesia e esperando pelo retiro de novembro de coração tão aberto... de me dar por satisfeito em poder pintar minhas raras aquarelas que são um prazer pessoal e convívio com o belo, um exercício para o Rei de Espadas. Toda a cratera que o destino cavou em minha vida foi preenchida com um combustível que só os deuses podem fornecer... Isso aos poucos começa a explodir suavemente em forma de canção. Incinerando junto com a música as barras da minha jaula, liberando os pets que um dia foram bestas enfurecidas. 
Todos pagaram para eu ser feliz. Meu pai que morreu triste e desesperançado, meu irmão louco terminando sua vida insana num hospício, minha mãe que agonizou dois anos tomando morfina sem me ouvir chamá-la... essa palavra não aprendi a conjugar! Paguei também com incontáveis adeuses... Talvez a gente só seja realmente feliz pelo que se é capaz de pagar antecipadamente. "Viver é mesmo muito perigoso", como meu amado Guimarães Rosa tanto repetiu... Graças a Deus aprendi a ginga dos negros.
Repare as fotos. Veja o detalhe dessas pequenas muralhas que foram construídas pelos árabes para evitar o deslize do vale. Ainda vou descobrir isso mais a fundo. Eles deviam usar esse vale para plantar alguma coisa. É o mesmo tipo de aproveitamento de terreno em declive que os incas praticavam. Há uma foto que mostra isso em detalhe. Os pedreiros árabes ainda são mestres nisso. Constroem muros de pedra sem necessidade alguma de cimento. O muro do fundo do meu jardim é construído assim. As pedras se encaixam como um puzzle resolvido. Esse caminho da floresta é coalhado de seixos, pois toda a água da estação de chuvas desce por ali. 
Aos poucos o outono começa seu presságio. As noites são mais frescas e o sol já não pune seu castigo de luz tão impiedosamente. 
Filho, fique com todos os adeuses, todos os presentes, passados e futuros semíticos ou não. O tempo vibra e não há faróis em alto mar. Deus é pura velocidade. Ele só existe mesmo quando vivido. Por isso a vida não compartilhada como uma liturgia é um erro, um pecado (termo originado do latim peccare, significa literalmente perder o pé, tropeçar. Ouspensky disse uma vez que a palavra pecado significava perder o caminho ou perder a meta). A única meta possível é o caminho de volta para a Luz, de onde todos viemos, para onde nossas almas emergirão algum dia. Todo Amor. Um beijo na Isadora. Cuidem bem de vocês minhas amadas crianças. Seu no Dharma. C.

PS: Acabo de falar com a Mihal a respeito dos muros da floresta. Eles são centenários. Foram usados há muito tempo como terraços de cultivo. Já não se sabe do quê.
Mas estão lá, esperando você e a Isa, atravessando estações, tempo aparente e dimensões desconhecidas. Jerusalém...




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