sábado, 14 de setembro de 2013

Onde o sol bate e se firma









Pérolas...que se encontra ao longo da vida... São raras. Tantas e tantas histórias incontadas! Amanheceres construídos com as próprias mãos... Tintas que ninguém previu. Tive todo meu dia tomado pelo e-mail que você mandou!
Só o que posso te dizer é que me fortalece, como talvez já tenha dito antes. O fato de ler sua mensagem logo cedo, 5:30 da manhã foi um presente dos mais lindos.
Quarta é um dia em que tenho um trabalho que faço em Jerusalém. Acordo cedo para ter tempo hábil de começar meu dia numa nota alta. Uma meditação longa de 30 minutos. Ao longo do dia faço mais algumas pequenas sessões. É parte da prática. E o dia todo uma prática também. Não faria sentido se não o fosse!
Passei quatro horas sozinho fazendo minhas comidas com o sentimento totalmente voltado em Araraquara.
Você menciona que não conhece Israel! Pois agora há mais de mil motivos para vir e conhecer! A gente precisa planejar isso bem para aproveitar o máximo.
Não tem muito tempo que cheguei aqui. As coisas foram se desenhando de uma forma mágica. Como a casa em que moramos agora e que foi um achado, por exemplo. Chegamos em Abril, 19 Dia do Índio, para procurar residência e tínhamos metade daquele mês mais maio inteiro para encontrar um lugar que fosse conveniente. Ficamos então num pequeno apartamento numa vila de casas próximo daqui. Na primeira ligação que fizemos ao ver lugares para alugar em Jerusalém e Ein Karem, encontramos essa. Bárbara. Uma casa árabe. Provavelmente construída antes de 1948. Longa, retangular, com o teto da sala abobadado e as paredes da cozinha em pedra. Estou mandando umas fotos para você ver.
Há outra casa em cima da nossa. Nela mora Mihal Ben Gal, viúva de Yussef Ben Gal, um poeta que agitou a vida cultural daqui nos anos 60 e 70 até se deparar com o trabalho de Gurdjieff e as ideias do Sufismo. Ele manteve onde hoje moramos, grupos de estudo sobre essas 'filosofias'. Mihal nasceu num kibutz ao norte de Israel em 1942. Seus avós vieram para cá no que eles chamam o segundo 'aliá', o começo da imigração judaica para a Palestina de então. Esses judeus da época começaram a viver em comunidades, em lugares pouco explorados e condições precárias. Os judeus que vêm dos 'kibutzim' têm uma forma de viver e pensar completamente distinta. Há algo diferente no comportamento deles. A vida em comunidade cria algo muito legítimo, assim como o fato de as mulheres servirem exército por dois anos e os homens três influi muito no sentimento de nacionalidade. Isso é tanto inteligente quanto necessário na cultura israelense. Mas esse é um assunto muito longo! Mihal é maravilhosa. Uma mulher de 71 anos ligadíssima. Trabalhou na chefia do setor de Arqueologia da Fundação Rockefeller por mais de trinta anos. Ela participou também de muitos projetos externos em escavações. Tanta história tem para contar! O mais lindo é que ela editou um livro póstumo com as poesias de Yussef. Ele tinha cinco livros publicados em vida. São poesias espirituais, de uma luta contra Deus. Ao final ele amansou. Fez as pazes com o Velho. São esses poemas que Mihal compilou e publicou. Só ela sabe o doze que cortou com ele. Eles tiveram um filho, Asaf. Ele morou aqui nesta casa com Karem,sua linda esposa e seu filho, Ilay, um menino cujo semblante me lembra muito a criança que fui um dia. Mas eu vejo nele muito da expressão de seu avô. Yussef Ben Gal lembrava um pouco Ernest Hemingway. Mihal concorda. Teria  com certeza gostado muito de Yussef se o tivesse conhecido.
Dou-me muito bem com ela, apesar do pouco tempo que temos como vizinhos. Conversamos muito. Ás vezes jantamos no nosso jardim. Ela gosta muito da minha comida. Como você vê, há um material imenso aqui para conhecer. Mihal é um grande e imprescindível detalhe. Não sei realmente por onde começar a contar tudo. 
Nós temos também um apartamento em Herzilyia, perto de Tel-Aviv. Está alugado, já que até então morávamos no Brasil. Mas não temos planos de nos mudar para lá. O contrato de nossa locatária vence agora em dezembro. Nossa vida parece realmente se encaixar aqui. Estou farto de cidade! Vejo que minha mentalidade cosmopolita me faz sentir um estranho dentro do terno do dia a dia muitas vezes, como se o defunto fosse maior. O fato é que o palhaço era meu tio. Ele me ensinou a construir o picadeiro, vender pipocas e depois dispor as cadeiras e fazer o show, como escrevi certa vez num velho poema.

Tenho receio de elaborar um tratado e esbarrar em seu enigma de esfinge, em seu silencio de tantos anos... Para mim é a maior referência, o grande arquétipo de iluminação, o maior exemplo de como um grande trabalho pode ser efetuado sem ruídos. O que sou hoje, esse resultado desconhecido mas constante, não ocupado com o improvável, esse pequeno sol de alma que criei, tudo isso devo à pedra de toque que foi e é para mim. Todos os reencontros foram para mim eventos marcantes. Sinceramente, não sei se está ao meu alcance esse merecimento. 
Mas só o fato de poder falar isso tudo com você, de poder compartilhar este momento, para mim é como estar eternamente de férias. Uma bênção que reflete faíscas aos coriscos.
A Mahamudra é um artigo para uma nova correspondência! Eu gostaria realmente de falar de forma intencional a respeito.
Copiei uma foto de Dan Brown em 'minhas imagens' pensando em mandar-lhe. Segue nesta. Foi tirada no primeiro retiro que fiz com ele em 2011. Quando estava batendo essa foto ele me disse: "Pense em Dharmakaya".
Achei maravilhoso você estar praticando Yoga com esse envolvimento. Você seria uma instrutora muito interessante, para dizer o mínimo.
Por que não? Mas tome seu tempo. No entanto, considere. Eu mesmo gostaria de ter uma professora como você. Faria minha cabeça!
Grande Amiga, fique com todo meu Amor. Escreva. Me conte coisas. Obrigado por essa luz. Todos precisamos. Ainda bem termos uns aos outros. Seu no Dharma. Sempre. C.














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